quinta-feira, 17 de julho de 2014

Israel, a Palestina e os Cristãos

Nos últimos dias a mídia internacional tem sido inundada de notícias sobre o conflito Israel-Palestina, uma vez que esse tem sido o maior acirramento do conflito desde 2009. As imagens são chocantes, mísseis israelenses invadindo a Faixa de Gaza e gerando inúmeras vítimas civis, sobretudo crianças e mulheres. Daí não falta posts nas redes sociais escritos por cristãos que ou defendem Israel por crerem que esse ainda é o povo de Deus ou aqueles que embora tenham uma teologia correta com relação aos judeus, movidos por boas intenções, creio eu, assumem a posição do lobby pro-Palestina e acusam Israel de ser a praticamente a única manifestação da depravação humana na terra. Tudo isso me entristece profundamente, pois era contra essa ignorância com relação aos judeus que Paulo adverte a Igreja de Roma (Rm 11.25).

Em primeiro lugar é necessário esclarecermos que o atual Estado de Israel não é o cumprimento de profecias bíblicas, mas que foi criado mediante a soberania de Deus sobre a História a fim de cumprir os Seus próprios propósitos, uma vez que Deus é soberano e rege as nações (Sl 2). Isso, portanto, não significa que os cristãos devem apoiar o Estado judeu em todas as suas políticas e ações. Ao contrário, significa que nós como cristãos devemos ver o Estado de Israel como um Estado secular e pecador igual a qualquer outro, reconhecendo os seus erros e combatendo-os, principalmente as suas práticas abusivas que são implantadas contra os palestinos, as quais violam diretamente os seus direitos humanos e vão contra as atribuições estabelecidas por Deus para os Estados (Rm 13).

Um segundo esclarecimento necessário diz respeito à natureza do verdadeiro povo de Deus hoje em dia. Os judeus que hoje existem não são mais o povo de Deus, uma vez que na Nova Aliança através do sacrifício de Jesus na cruz a salvação se estende a todos os povos, de todas as etnias e nações (Is 19.23-25, Mt 28.19, At 2.11, Ap 5. 8-10). Isso pode ser visto claramente no que Paulo diz aos Gálatas, ao afirmar que os verdadeiros filhos de Abraão não são apenas os judeus, mas os eleitos de todas as nações (Gl 3.6-8). Isso significa que o verdadeiro povo de Deus hoje é formado não apenas por judeus, mas também por alemães, palestinos e árabes! Ainda hoje há judeus que se convertem ao Cristianismo ao reconhecer Yeshua (Jesus) como o messias e esses sim é que passam a ser o povo de Deus, mas não os outros judeus que rejeitam a Jesus, como é a grande maioria dos judeus que compõem o atual Estado de Israel.

Tudo isso me faz crer que se o povo de Deus é formado tanto por judeus quanto palestinos, no atual conflito não devemos ficar nem do lado de Israel tão somente, nem do lado dos palestinos como se eles fossem as únicas vítimas da História. Devemos levar em consideração os princípios bíblicos de justiça e ter em mente que no atual conflito, ambas as partes são injustas e cometem atrocidades mútuas, violando assim a Lei de Deus. Isso não significa, contudo, que devamos ser imparciais, até porque isso é impossível, mas sim que devemos ficar ao lado da Igreja, o povo de Deus e para isso precisamos saber onde eles estão e como tudo isso os afeta.

Infelizmente embora seja o berço do Cristianismo, a atual “Terra Santa” é um dos lugares onde há menos cristãos. Os números são bastante inexatos, mas crê-se que apenas 2% de toda a população de Israel e dos territórios palestinos ocupados (Faixa de Gaza e Cisjordânia) sejam cristãos. Isso se dá devido a dois fatores: conflitos na região e perseguição religiosa. A criação do Estado de Israel em 1948 e os conflitos que o seguiram geraram uma grande onda de refugiados palestinos, entre os quais estavam em sua maioria cristãos, fazendo com que a sua presença na região diminuísse significativamente já a partir daí.

A situação, porém, piorou ainda mais após a Segunda Intifada palestina quando a Autoridade Palestina passou a administrar a Cisjordânia e o Hamas a Faixa de Gaza, o que ocasionou o surgimento da perseguição aos cristãos palestinos, os quais passaram a ser identificados diretamente como aliados ao governo israelense e por isso perseguidos. Tal perseguição advém da própria sociedade palestina, majoritariamente muçulmana, mas é de certo modo legitimada pelos governos da Autoridade Palestina e do Hamas. Os abusos sofridos pelos cristãos na região são vários: há conversões forçadas ao Islã, mulheres cristãs sofrem violência por não usarem o véu islâmico, igrejas são bombardeadas e alguns líderes da igreja até mesmo assassinados. Não é à toa que segundo a Missão Portas Abertas, os territórios palestinos são o 34° lugar em uma escala de 50 em que os cristãos mais sofrem perseguição.

Tanto o Hamas quanto a Autoridade Palestina possuem claramente uma agenda islâmica anti-cristã e isso por si só já seria um grande motivo para os cristãos não os apoiá-lo. Mas por outro lado, e quanto a Israel? Israel é a única democracia do Oriente Médio e teoricamente o Estado assegura o direito de liberdade dos cristãos. Lá também é o único lugar do Oriente Médio em que a população cristã ao invés de diminuir tem crescido. Mas isso não significa que os cristãos não são perseguidos em Israel. Lá a perseguição existe sim e é impetrada por grupos de judeus radicais, os quais tem assento no Parlamento israelense e até criaram uma lei que proíbe a pregação do Evangelho em lugares públicos, como em ônibus. Além disso, também há perseguição por parte de setores mais extremistas da sociedade judaica que não aceita que judeus se convertam ao Cristianismo e persegue a pequena, porém crescente, comunidade de judeus messiânicos, os judeus cristãos. Ao mesmo tempo, o governo israelense também dificulta a migração de judeus messiânicos para Israel.

Tudo isso mostra que tanto em Israel quando na Palestina os cristãos sofrem e que ambos os lados cometem graves erros. Isso porque analisei apenas a questão da liberdade religiosa. No atual conflito entre Israel e o Hamas, por exemplo, é verdade que as bombas lançadas por Israel são proibidas pelas convenções internacionais devido aos danos que podem causar em seres humanos, sendo considerado um crime. Mas por outro lado, e quanto aos civis palestinos que são utilizados pelo Hamas como escudos humanos para se defender dos taques israelenses? Assim, qual deve ser a posição de um cristão diante disso tudo? Creio que Paulo nos diz em Romanos 11.25-27:

Irmãos, não quero que ignorem este mistério, para que não se tornem presunçosos: Israel experimentou um endurecimento em parte, até que chegasse a plenitude dos gentios. E assim todo o Israel será salvo, como está escrito: "Virá de Sião o redentor que desviará de Jacó a impiedade. E esta é a minha aliança com eles quando eu remover os seus pecados".

            Paulo ao escrever aos Romanos os advertiu sobre a sua ignorância e presunção frente aos judeus. Provavelmente estava surgindo na Igreja alguma espécie de anti-semitismo. Talvez pelo fato de que ainda estivesse muito vívida a imagem de que foram os judeus quem mataram Jesus, o que sabemos ter sido apenas uma expressão da vontade de Deus, pois quem matou Jesus foi o próprio Deus. O fato é que infelizmente ao longo da História a Igreja tem sido ignorante com relação aos judeus e tem sido uma das maiores fontes de anti-semitismo. Vemos isso durante o período da Inquisição da Igreja Católica e até mesmo nos escritos de Lutero, o pai da Reforma que tanto admiramos e por quem somos tão gratos a Deus. Lutero, apesar de ter sido um homem muito piedoso e temente a Deus, era falho. Ele não compreendeu o mistério de Israel do qual Paulo fala em Romanos 11 e segundo alguns historiadores foi quem lançou as bases do anti-semitismo de Hitler. Essa mesma onda de anti-semitismo tem voltado a afetar a Igreja de Cristo nos dias atuais, mas com um novo nome: anti-sionismo!

Muitos cristãos fiéis, por crerem nos pressupostos aqui assumidos no início do texto sobre os judeus e ao verem os erros que o atual Estado de Israel tem cometido contra os palestinos acabam assumindo lobby pro-Palestino, o qual não quer simplesmente o fim da ocupação israelense e justiça para os palestinos, mas sim a destruição do Estado de Israel. Soma-se a isso um grande aumento em escala global do extremismo islâmico, que tem como principais alvos cristãos e judeus. Ou seja, se o Estado de Israel deixar de existir hoje, veremos um banho de sangue judeu maior do que o Holocausto. Um vislumbre que podemos ter disso é a perseguição aos cristãos em contextos islâmicos.

Devemos sim, como cristãos lutar por justiça para os palestinos e criticar determinadas ações do Estado judeu, mas não sermos anti-semitas. Digo isso, porque logo alertar a Igreja a não ser arrogante quanto aos judeus, Paulo revela o “mistério de Israel” que consiste no fato de que os judeus serão reconciliados por Deus após a plenitude dos gentios se completar. Isso significa que após o Evangelho do Reino ser pregado a todos os povos (Mt 24.12), haverá um avivamento entre os judeus e um grande número deles será salvo, completando assim o número de eleitos e preparando o caminho para a volta de Cristo. Entretanto, vale salientar que para que a plenitude dos gentios se complete eleitos de todas as nações devem ter ouvido a pregação do Evangelho.

Hoje os povos menos alcançados pelo Evangelho são exatamente aqueles que mais odeiam os judeus: são as diversas etnias árabes e os povos do Oriente Médio que professam o Islã. Os palestinos mesmo são considerados um povo não alcançado pelo Evangelho. O Islã é a última fronteira missionária para o Cristianismo e o Evangelho tem que voltar à Jerusalém, completando assim a plenitude dos gentios para que haja o avivamento entre os judeus e assim a paz seja estabelecida no Oriente Médio. Ou seja, Jesus, o Príncipe da Paz e o Seu Evangelho são a solução para o conflito entre árabes e judeus. O que os dois povos precisam é o Evangelho!

Paulo fala que a conversão dos gentios levará os judeus ao ciúme e assim eles serão novamente enxertados na oliveira, que é Jesus. Por isso, o papel de um cristão diante do conflito Israel-Palestina é orar para que o Evangelho seja pregado entre os árabes. Orar por um avivamento na Faixa de Gaza e na Cisjordânia. Um cristão de verdade deve amar os palestinos, pois assim estará também amando aos judeus e a Cristo. É por isso que como cristãos devemos tomar o lado da Igreja. Devemos fortalecer a Igreja nos territórios palestinos e em Israel. Devemos nos levantar contras as injustiças cometidas em ambos os lados. Mas acima de tudo devemos pregar o Evangelho a eles. A salvação dos judeus passa pela salvação dos palestinos. A paz na Faixa de Gaza é a paz em Israel e vice-versa.

Uma das coisas que tem me incomodado é perceber como no Oriente Médio muitos vêem no Islã a solução para o conflito e não temem divulgar isso. Aqui no Ocidente, sobretudo na academia, crer-se que ideologias humanistas como o Marxismo é que fará isso. Mas se realmente somos cristãos e cremos que a Bíblia é a palavra de Deus, veremos que é o Evangelho é que é a solução para todos os problemas. Por que, então, tememos afirmar isso?

É por isso que oro a Deus para que os cristãos da minha geração não ignorem o mistério de Israel. Que não cometamos os erros que a Igreja cometeu no passado com relação aos judeus. Que amemos os judeus, mas também amemos os palestinos. Que nos lembremos que a maior injustiça social é a falta de pregação fiel do Evangelho e a maior ocupação é a ocupação espiritual por sofismas e falsas ideologias que se opõem a Cristo. Que uma das nossas demonstrações de amor por Cristo seja amar os judeus e consequentemente os palestinos.

Igor Sabino

Graduando em Relações Internacionais pela UEPB
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